segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Para um Toural 3 em 1

Pormenor do jardim de Forestiere, em Fresno.

Não faltava por aí quem dissesse que em Guimarães não acontecia nada. Em tais ditos deve ter tido origem a febre que atingiu os da nossa governança municipal, dispostos a demonstrarem que, afinal, a cidade mexe. Reparando bem, terão concluído que o Toural estava mesmo a pedir uma mexida, uma vez que se mantém praticamente inalterado há vários lustros. Como sentiam que era urgente fazer qualquer coisa, chamaram um par de arquitectos, reunindo-se todos na Cervejaria Martins, à volta de uns finos e de uns improváveis caracóis. Rebentou então uma estupenda tempestade cerebral, que fez pairar sobre o Toural uma Névoa um tanto ou quanto sombria. Eis senão quando, tiveram uma ideia brilhante, porém óbvia: o que o Toural precisa é de um parque subterrâneo e de um restyling que o transforme numa praça adequada à moda da estação, sem árvores, mas com uns canteiros de hortênsias ou hortaliças similares, folheada a granito made in China. Ao contrário dos municípios e dos arquitectos, que o que mais querem é fazer obras, os vimaranenses são, por inércia, natureza e tradição, avessos à mudança, pelo que a discussão se pôs tão viva como deverá estar o carvão com que a D. Maria assará as castanhas outonais. A vox populi inflamou-se. Porque é que se vão agora meter com o nosso Touralinho, se ele está tão bem como está e não fez mal a ninguém? Para quê um parque subterrâneo, se o que para aí mais são parques, até mesmo subterrâneos, que, em vez de recolherem carros, servem de abrigos para moscas? Já quanto aos propósitos de holocausto arborícola, por uma questão de simples decência, estamos impedidos de aqui reproduzir o que por aí se tem dito.

Dei comigo sentado na esplanada da Camir a pensar sobre o momentoso problema que agora nos inquieta. Esvaziado um par de finos, que emborquei sem o acompanhamento dos abomináveis caracóis, acabei por ter uma iluminação brilhante, porém inaudita. Confesso que o mais difícil foi encontrar uma solução capaz de compatibilizar as árvores com o parque de estacionamento e o espaço pedonal. Confesso, também, que a invenção não é minha, mas de Baldassare Forestiere, um horticultor siciliano que emigrou para a América em anos recuados de novecentos e que, ao longo de quatro décadas, com inventiva e pertinácia, gastou a vida a escavar um jardim prodigioso em Fresno, na Califórnia, onde plantou inúmeras variedades de árvores, da oliveira à tangerineira, passando pelo pereira italiana, pela alfarrobeira, pela amendoeira ou pelo kumquat. Um jardim botânico vicejante e subterrâneo. Levada à prática, a solução que proponho irá afirmar-se, seguramente, como um poderoso factor de atractividade turística, capaz, até, de ombrear com o Fluviário de Mora, ao mesmo tempo que responderá às preocupações dos que agora se levantam contra o planejado arboricídio.

A minha proposta de intervenção no Toural, que será um manifesto pós-moderno, futurista, revolucionário e genuinamente vimaranense, integra três componentes:

a) um jardim subterrâneo;

b) um parque de estacionamento de superfície, ao nível do actual jardim;

c) um novo piso, elevado por cima dos edifícios, com a exacta dimensão da praça actual, onde será criado um magnífico rossio pedonal, no qual se poderá desfrutar de toda a amplidão e majestade daquele espaço, com o valor acrescentado da possibilidade de fruição de uma fantástica visão panorâmica, a 360º, sobre a cidade. O acesso a esta nova praça será assegurado por quatro elevadores transparentes, implantados nos cantos da praça.

Eis aqui uma solução 3 em 1 para o Toural, capaz contentar todos os vimaranenses agora desavindos, por conjugar um parque para automóveis, um jardim, com árvores e tudo, e uma praça generosa e desafogada, exclusiva para peões.

2 comentários:

  1. Estivemos reunidos a debater as vossas ideias e achamos que se pode apresentar ainda outra proposta, que, se quiserem podem adicionar à vossa:

    Colocar toda a Praça do Toural dentro de uma redoma, o que permitiria a sua fruição em dias de chuva, além de permitir cheirar em exclusivo os gazes do parque de estacionamento, onde a rapaziada nova iria para "sacar" piões (isto prevendo que o parque esteja "às moscas"...

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  2. Meu caro da Glória,

    Depois de analisada a inovação que sugere que se introduza na nossa proposta, concluímos que é brilhante, porém irrealista.

    Brilhante, porque, certamente, a redoma seria de vidro.

    Irrealista, porque uma redoma com aquela dimensão iria tornar-se numa assustadora fonte de problemas:

    - geraria o efeito de estufa, com consequências desastrosas e incontroláveis no desenvolvimento das plantas do jardim subterrâneo, onde certamente eclodiria uma sucessão de fenómenos do Entroncamento, tão grotescos quanto indesejáveis;

    - ao mesmo tempo, passaria a ser uma poderosa caixa de ressonância que amplificaria todos os ruídos, tornando o ambiente infernal e, portanto, insuportável (só de o pensar, fico com os nervos em franja);

    - e, pior que tudo, seriam incomportáveis os custos de manutenção, em especial os que adviriam da exigência de limpeza permanente do cocó das pombas, sob pena de, em menos de três tempos, a redoma deixar de ser transparente, para passar a cor de trampa esbranquiçada, entre translúcida e opaca.

    Portanto, quando quiser avançar com propostas, por brilhantes que sejam, é aconselhável que as faça acompanhar pelo respectivo caderno de encargos. Assim, escusamos de perder o nosso bendito tempo a analisar sugestões impraticáveis.

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