sábado, 27 de setembro de 2008

Afonso Henriques e a Baguete

À venda no Café Toural (várias cores e todos os tamanhos)

Hoje dei comigo a reflectir acerca da natureza flutuante das nossas convicções. Mesmo as mais firmes, mais tarde ou mais cedo, às vezes logo, vacilam e são esmagadas pela falta de coerência, pela duplicidade e pela bivalência que estão subjacentes ao ápodo das duas caras que nos foi lançado, como uma maldição, por mentes malévolas e, porventura, um tudo-nada mal-intencionadas.

Veio esta reflexão depois de ter tido a desdita de ler, num jornal cá da terra, um senhor que exsuda opiniões, convicções e certezas, comparar o nosso bem-amado Dom Afonso Henriques, entre outras coisas, a sapatos, a chocolates, a vinhos, a relógio e às nojentas baguetes, daquelas que os franceses costumam carregar debaixo dos sovacos. Naturalmente, fiquei irado. Senti uma indignação irreprimível tomar conta de mim e congestionar-me as meninges. Enrubesci e, ao enrubescer, afogueei-me, chegando mesmo a avermelhar. Saí à rua, decidido a procurar o desbocado autor de tão insidiosas comparações e a fazê-lo engolir os dentes e as comparações.

Passos não eram dados, começou a manifestar-se o meu irrefreável carácter dúplice: pensando bem, aquilo é capaz de não estar assim tão mal achado. Afonso Henriques até pode dar um produto com muita saída. Já era o meu coração tilintante a funcionar.

Logo comecei a ter a visão de cifrões esvoaçantes sobre o Paço dos Duques, enquanto ia subindo a Muralha. Um produto? Não. Porquê pensar pequeno? Muitos produtos. Todos os produtos. Todos com a marca Afonso Henriques. A marca que nos fica bem, como dizia o outro, com uma preocupação não meramente sentimental, mas fundamentalmente comercial (e disse-o: não teve vergonha de o dizer).

Logo comecei a antever um futuro venturoso e próspero, com os vimaranenses a abandonarem tudo para irem vender o Afonso Henriques, é pró menino e prá menina, venha cá freguês, pague dois e leve três. Na farmácia: arranja-se alguma coisa para um problema de caspa? Problema? Já não é problema: depois de três aplicações da loção Afonso Henriques, vai-se a caspa e ainda ganha um cabelo brilhante e volumoso como o da Penelope Cruz. Na pastelaria: que deseja, minha senhora? Cento e cinquenta gramas de Afonso Henriques, mas cortado fininho, por favor. No Ferreira da Cunha: mostra-me pés-de-cabra, por favor. Pés-de-cabra? Isso já não se usa, homem. Agora, só vendemos Afonso Henriques. É muito melhor do que um pé-de-cabra e ainda serve para coçar as costas.

Já vejo Guimarães inundada de merchandising afonsenriquino: porta-chaves, cinzeiros, esferográficas, bonés, toalhas de praia, aventais, pins, bandeirinhas, pratos, cachecóis, guardanapos, papel higiénico. Tudo recuerdos de Afonso Henriques para turista comprar. E já pressinto, multidões de vimaranenses de todas as idades a ostentarem garbosamente sobre seus peitos a frase I love Afonso Henriques (que, lamentavelmente, em certos troncos espadaúdos, poderá soar com uma entoação insidiosamente ambígua e vagamente gay).

E a marca Afonso Henriques trará consigo, se não o choque tecnológico, as novas oportunidades da gastronomia vimaranense, que ganhará um novo e imparável ímpeto. Já adivinho Afonso Henriques em todas as ementas: não faltarão os bifes à Afonso Henriques (de vaca galega em sangue, sobre cama de erva mourisca, com crocante de trigo-sarraceno), nem as favas à Afonso Henriques (com chouriço mouro), nem tão-pouco as postas de pescada acaralhadas à Afonso Henriques (receita original da Adega dos Caquinhos). No tocante às sobremesas, abrir-se-á um vasto e promissor território a desbravar, onde certamente constarão, entre tantas outras iguarias, as raivas de Viseu e os suspiros de Coimbra. E o vinho da casa, em todas as casas, terá uma marca: “Terras de Dom Afonso”.

E já imaginava o apregoar das maravilhas das pílulas Afonso Henriques, o “viagra do Minho”, quando, ao subir a rua do Beringel, uma simpática e desdentada senhora se aproximou de mim e me disse:

“Ò Honoré, vais com um ar tão caidinho que deves estar mesmo em necessidade. Anda daí, homem, que eu faço-te um Afonso Henriques e ainda te dou um desconto”.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

O Nosso Bairro de Barracas

«Se me lembrasse de dar uma festa de grande opulência no meio de um bairro de barracas seria uma enorme afronta a quem lá vivia» e foi isso «que o primeiro-ministro fez».

Manuela Ferreira Leite dixit, a propósito do comício de rentrée de Sócrates em Guimarães. Braga (onde mais podia ser?), 25 de Setembro de 2008. Via TSF: Sócrates fez grande festa num «bairro de barracas», diz Ferreira Leite

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Magalhães é que está a dar...


REVISTA DE IMPRENSA


Magalhães é que está a dar...
Tudo o resto, que se passa pelo país, não interessa.
Magalhães envolto em polémica
Ponte da Barca ou Sabrosa? Qual é, afinal, a sua terra de origem?

Contactado pela Lusa, Alexandre Parafita, escritor natural de Sabrosa, doutorado em Cultura Portuguesa, afirmou que, em Portugal, além de Sabrosa e Ponte da Barca também o Porto reclama a naturalidade de Magalhães.

[Não percebo a controvérsia: toda a gente sabe que o Magalhães é de Cavês.]

Magalhães exportado para a Venezuela
Apesar de considerar a iniciativa de trazer o Magalhães para o país como sendo positiva, os meios de comunicação criticam o Governo de Hugo Chávez por, em vez de criar uma empresa nacional, optar por criar "outra empresa mista, com os portugueses".

Contente com o Magalhães, mas…
"Estou contente com o Magalhães, mas não gosto do nome que lhe puseram, é feio", confessa Mariana, que encontrou ainda outro defeito: "Também não gosto desta asa".

O Magalhães ao alcance de todas as bolsas
A FNAC vai começar a vender o Magalhães à meia-noite de dia 26 de Setembro, por 285 euros.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Também Quero Uma

O Antunes já tem uma Câmara. Também vou querer uma para mim.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Para Acabar de Vez Com Todas as Perguntas

Fugimos. Mas não foi por causa do carjacking. Nem da violência doméstica. Nem dos raptos de caixas de multibanco. Nem do Verão que não o quis ser. Nem sequer das Gualterianas ou da falência do Lehman Brothers. É certo: não tivemos outro remédio senão esconder-nos dos olhares inquisitoriais. Passamos a andar anónimos, incógnitos, encobertos. Já estávamos fartos. Cansados. Moídos. Enfadadados. Já não aguentávamos mais as mesmas perguntas irritantes e já nos falhava a inventiva para mais meias respostas. Arre! Não, não sabemos nada da Capital Europeia da Cultura! Ponto final. Agora, temos colocadas as nossas melhores esperanças no acelerador de partículas do CERN. Pois que acelere e que acelere muito, porque, acelerando a preceito, isto ainda acaba antes de 2012. E a avó do outro já vai dizendo, num entre dentes falheiro de dentes: antes o fim do Mundo do que a desonra ou a vergonha. Venha, pois, o big bang, porque o buraco negro já cá mora: é a CEC, que, ao que vemos, mas não ouvimos, já foi engolida por um silêncio tão espesso, tão imenso e tão silencioso que só pode ser augúrio de coisa ruim ou muito pior.