quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Eu Gosto É Destas Macacadas!

Se tens telhados de vidro...

Contradições, Desmandos E A Falta Que Faz O Emprego...

Querem lá ver que alguém se esqueceu de avisar que tinha dado uma entrevista ainda por publicar, tanta era a vontade de aproveitar a oportunidade...

Há pois, dois sinais contrários nesta questão:

a) positivo: a nova ministra não é tola (valha-nos isso!), pois percebeu o estado da coisa, ainda há quinze dias;

b) negativo: isto está mesmo mau, até os médicos, mesmo achando que a política de saúde deste governo não vale um chavo, vêem que mais vale alinhar com eles do que levar com um processo disciplinar ou outra coisa qualquer...

Ou, então, avisou, mas o Sócrates já nem liga... assim, como assim, está tudo a dormir e a trapalhada é conceito de aplicação exclusiva ao Santana.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Da Cultura e das Côdeas de Broa

Ainda me lembro, como se fosse hoje: a minha avó mandava-me à padaria, todos os dias, antes do almoço, que ela teimava chamar de jantar, um quilo, e traz o troco. Na padaria, o Sr. Torres tinha uma mão muito certeira, raramente falhava o corte. Um quilo de broa? Pegava na faca de serra, fixava-se na broa (no tempo em que uma broa era uma broa e não um arremedo como essas de agora) como quem a media com os olhos e cortava um pedaço, que punha à balança. Um quilo? Ora aí está! Porém, às vezes falhava-lhe o olho, ou a mão, ou a faca, aquilo não dava bem um quilo, e o Sr. Torres lá tinha que colocar mais um pedacinho para compensar o peso em falta, normalmente mais côdea do que miolo, que eu roía a caminho de casa. Era o contrapeso.

Percebo agora que com as remodelações governamentais acontece algo de muito semelhante. Certo dia, o Sr. Primeiro-Ministro acorda bem disposto, cheio de vontade de remodelar. No palácio, com o 1492 do Vangelis em fundo, mal se senta à grande mesa, anuncia, categórico e determinado, como quem sabe que cumpre um desígnio sem saber muito bem qual seja: Meus senhores e minhas senhoras, hoje vou remodelar! Percorre a mesa com os olhos, sente os ministros encolherem-se, fazendo-se pequeninos e querendo-se invisíveis. E diz: Tu aí que andas com ar de pouca saúde, estás remodelado. Põe o Ministro da Saúde na balança e logo conclui que não tem peso suficiente para atingir a condição de remodelação. Precisa de um contrapeso. Novamente, percorre a mesa com os olhos, sente os ministros encolherem-se, fazendo-se pequeninos e querendo-se invisíveis. Por fim, diz, dirigindo-se à Ministra da Cultura: Desculpa, tu até tens sido porreira, pá, mas também te remodelo. E lá teve o sr. Engenheiro a sua remodelação.

E assim se demonstra que, se não se lhe encontra outra serventia, a cultura sempre pode servir de contrapeso. Tal e qual como as côdeas de broa do Sr. Torres.

domingo, 27 de janeiro de 2008

A Preguiça, ou os Efeitos da Picada da Mosca Tsé-Tsé no Urbanismo Índigena, ou a Jóia da Coroa que Já Era

Afinal, há quem, parecendo acordado, não perceba aquilo que eu, pobre diletante, cidadão distante, aborígene distraído, adivinho mesmo a dormir. Há dias, alguém perguntou aqui, num comentário, “que é feito de quem tem responsabilidades políticas, na situação ou na oposição?”. Acabo de encontrar a resposta. Leio no jornal de hoje que na oposição (pelo menos na maior fatia dela) se mergulha nos braços de Morfeu e se vota sem se analisar o que se vota. E que na situação (pelo menos na primeira figura dela) também se poderá andar a passar pelas brasas nas horas de expediente. Ou isso, ou o nosso alcaide foi acometido por um refinado sentido de humor que o leva a contar a piada do ano, a de que o mais prestigiado dos serviços municipais vimaranenses não perde autonomia ao tornar-se numa divisão acéfala de um departamento macrocéfalo. Um serviço que cuidava da requalificação do Centro Histórico e que apenas respondia directamente perante o Presidente da Câmara (que não tinha dúvidas em classificá-lo, muito justamente, como “a nossa jóia da coroa) que, primeiro, passou a responder perante um vereador recém-chegado, sem pedigree em matéria de centro histórico, e que, agora, passa a responder ainda mais abaixo, não perde autonomia? Perde autonomia, perde dignidade e, pior de tudo, parece que perdeu competências, já que deixou de ter voz activa na condução de projectos que são lançados sobre a sua área de jurisdição.

Pois é, andamos com soninho.

Entretanto, deve haver por aí gente bem desperta e, talvez, quem sabe, algo esperta.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

O Monumento

Diz o de Guimarães, o artista, que, ao conceber o monumento ao nicolino, pretendeu criar uma “forma simbólica, talvez sugerida pelo esvoaçar da "capa", que faz parte do traje académico”. Confesso que sempre me intrigou o “talvez” estrategicamente arrumado naquela explicação.

A capa do traje dos estudantes vimaranenses é preta. Vermelha é a capa dos toureiros. E, não obstante os trejeitos marialvas das festas nicolinas, não estou a ver qual seja a sua afinidade com touradas, garraiadas e outras manifestações quadrúpedes e afins. Para mim, aquilo era um mistério. Até hoje.

Pela manhãzinha, fui espreitar o monumento de que tanto se fala há tanto tempo. Em chegando ao meio do Campo da Feira, vi dois senhores de provecta idade a olharem para a coisa. Falavam assim:

- Ò Manel, aquilo daqui parece mais um pedaço de carne.

- É mesmo! Aquilo é um bife.

- É, mas é, uma costeleta.*

- Vendo bem, Jirónimo, é mesmo isso: uma bela costeleta, é o que é!

Olhei melhor e esmoreceram-se as dúvidas. Aquele monumento remete para o mais profundo da nossa identidade, com uma dimensão simbólica arrasadora, telúrica, quase sublime: é um tributo à costela de nicolino que há em cada um de nós. Não representa, talvez, uma capa de estudante. É, sem sombra de talvez, uma magnífica costeleta nicolina.

* Aliás: - É mazé uma costoleta.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

E Agora, Senhores Meus, o Euromilhões

E eis que, ao fim de tantos anos metido dentro da minha pele, me maravilho com uma descoberta sobre um lado de mim que desconhecia: tenho um dom, senhores. Eu não sonho, auguro. Eu não tenho pesadelos, tenho presságios. Eu adivinho!

Só não ainda adivinhei porque é que escolheram este preciso momento para quebrarem o selo de garantia do nosso Centro Histórico, outrora conhecido por GTL. Porém, suspeito que não deve ser preciso ser bruxo para desvendar tal segredo.

Última Hora - Guy Marais desapareceu

O assunto é grave e não merece sorrisinhos cínicos. Guy Marais, esforçado escriba deste café, não dá sinais de vida desde sexta feira passada, altura em que enviou um sms a Pedro de Leitões perguntando-lhe se queria ir jantar ao restaurante Cabeça de Porco, em Moreira. Posto isto, não mais atendeu telefones, respondeu a emails e, mais grave, à porta de seu apartamento vazio estava um bilhete manuscrito que dizia - e citamos - fui para Gondar. Ora, Guy, mitómano por vocação, dizia sempre que tinha um - e citamos - castelo em Gondar. Sabendo nós da inverdade de tal afirmação - Guy não tem nenhum castelo em Gondar, até porque não há castelos em Gondar - escarrapachamos* neste espaço a nossa preocupação e lamento pelo silêncio de Guy Marais. Afinal, quem cala consente.

* que palavra incómoda, não?

sábado, 19 de janeiro de 2008

Anjo da Guarda, Que é Feito de Ti?

Um destes dias, passando ao largo da Cervejaria Martins, cruzo-me com um grupo de aborígenes em discussão desabrida. O costume, pensei, o Vitória, o Cajuda, o Geromel e o Rabiola, talvez o fora-de-jogo, talvez o Pimenta. Enganei-me: era de obras que se falava. Alguém me atira: “E tu, ò Honoré, não dizes nada sobre o projecto?”. Respondi com o mais expressivo encolher de ombros de que sou capaz e segui caminho. Ouso confessar que tenho dormido descansado, apesar do alarme público que invadiu a cidade por causa do que se anuncia para o Toural. Sei que, ao longo do processo de requalificação do Centro Histórico de Guimarães, tão louvado, premiado e galardoado, a cidade acrescentou novos elementos ao seu património, entre os quais se inclui o GTL, serviço que, pela reconhecida excelência do seu trabalho de preservação/reposição da autenticidade dos modos de intervir no património, granjeou respeito internacional, tornando-se num case study no meio académico de Portugal e arredores. Portanto, dormia eu descansado porque sei que há gente sabedora e de confiança a velar pela cidade. Dormia, disse, mas esta noite não dormi. Em plena madrugada, ainda o galo não cantara, acordei sobressaltado, suando frio, com tremores, com palpitações e com uma ideia insólita a zumbir-me na mioleira. Levantei-me, molhei o rosto, verti águas e voltei para o quentinho dos lençóis. Tinha sido um pesadelo: claro que não tinham acabado com o GTL. Mas amanheci atordoado com uma premonição funesta. Para a afastar, pus-me a pensar, o que raramente faço. A conclusão a que cheguei agravou o meu estado de ansiedade: em tanto que se tem falado sobre os projectos para Guimarães, não temos tido sinais de vida dos técnicos a quem compete a tutela do programa de intervenção no Centro Histórico classificado com o título da UNESCO e todo o espaço que baptizaram, Deus os perdoe!, de zona tampão. Ainda antes do mata-bicho, fui a correr à Rua Nova, antigamente bem mais airosa com aquelas raparigas alegres e gentis que ali ofereciam os seus préstimos aos pobres necessitados. Lá estava a casa do GTL. Mas não estava o GTL. De uma varanda ao lado, uma velhinha, com poucos dentes e muita curiosidade, quis saber quem é que eu procurava. A minha resposta fez ricochete na dela: “Então não vale a pena bater. Eles já se foram embora há muito”. Começo a ficar apreensivo. Muito apreensivo.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Previsão do Tempo para Atouguia e Arredores

Em dois mil e oito Guimarães vai ter um bairro paki, um restaurante tailandês, mais dois japoneses, mais três italianos, uma mesquita, uma sinagoga, mais um ou dois bares gay, um bar clube lounge para elitistas de sexta feira, jornais que dêem notícias, jornais que dêem notícias com seriedade, uma estátua nova, um centro cultural bem pensado, uma casa das artes acabada, um clube de futebol novo, um teatrinho, menos matarruanos, mais intelectuais, um metro a sério – não metrinho -, um gabinete de reflexão sobre a cidade, que percebe que isto já vai de Nespereira às Taipas e já não do Fundador aos Jagunços, cinco projectos dos quais um e meio é passível de fornicar isto de vez, filmes estreados em tempo útil, menos cinema para imbecis de centro comercial, uma japoneira com duzentos anos, uma circular pensada com grandiosidade, uma saída nas Taipas na à onze, entretanto transformada em secute, uma feira erótica no multiusos, uma avenida nova, uma esplanada sem música de fezes a debitar, poetas malditos a vaguear pelos jardins, um canto dos faladores, um sistema de transportes públicos ferroviários competente, um mini-eco-bus para o centro, um festival de verão elegante, enfim, ó pá, é assim, dois mil e oito para Guimarães, pá, dois mil e oito vai ser um ano do c*****o.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Boletim Meteorológico: Previsão de Melhorias

Certo dia, quando 2006 percorria o seu último quarto, começou a pairar sobre o Toural a sombra de uma névoa vagamente insinuante. Ainda o ano não era findo, a sombra adensou-se: a névoa podia passar a Névoa, disse-o quem não se esperaria que o dissesse. Correu um ano completo, e a névoa lá continuava a pairar, ameaçadora, afiando as garras, enquanto espreitava o momento de cair sobre a presa, aparentemente desarmada e adormecida na sua inocência. Até que se anunciou: é mesmo Névoa que bate à porta do Toural. Mas a presa, afinal, não dormia. Deu luta. Estrebuchou. Sacudiu a cerração. Agora, parece que o Céu já se desanuvia e que a sombra se começa a afastar do Toural. O Toural fica melhor, muito melhor, sem o manto de Névoa.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Porreiro, Pá!

Porque, na sua infinita sabedoria, o povo nunca se engana, nada lhe será perguntado.

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

António Adiantou-se...

Andava com vontade de escrever isto, mas ele adiantou-se e, provavelmente, escreveu melhor e mais objectivo... Concordo tim-tim por tim-tim, mas acrescentava de bom grado, uns palavrões e uns insultos.


«Em consequência da revolução de 1974, criou raízes entre nós a ideia de que qualquer forma de autoridade era fascista. Nem mais, nem menos. Um professor na escola exigia silêncio e cumprimento dos deveres? Fascista! Um engenheiro dava instruções precisas aos trabalhadores no estaleiro? Fascista! Um médico determinava procedimentos específicos no bloco operatório? Fascista! Até os pais que exerciam as suas funções educativas em casa eram tratados de fascistas. Pode parecer caricatura, mas essas tontices tiveram uma vida longa e inspiraram decisões, legislação e comportamentos públicos. Durante anos, sob a designação de diálogo democrático, a hesitação e o adiamento foram sendo cultivados, enquanto a autoridade ia sendo posta em causa. Na escola, muito especialmente, a autoridade do professor foi quase totalmente destruída.

Em traço grosso, esta moda tinha como princípio a liberdade. Os denunciadores dos “fascistas” faziam-no por causa da liberdade. Os demolidores da autoridade agiam em nome da liberdade. Sabemos que isso era aparência: muitos condenavam a autoridade dos outros, nunca a sua própria; ou defendiam a sua liberdade, jamais a dos outros. Mas enfim, a liberdade foi o santo e a senha da nova sociedade e das novas culturas. Como é costume com os excessos, toda a gente deixou de prestar atenção aos que, uma vez por outra, apareciam a defender a liberdade ou a denunciar formas abusivas de autoridade. A tal ponto que os candidatos a déspota começaram a sentir que era fácil atentar, aqui e ali, contra a liberdade: a capacidade de reacção da população estava no mais baixo.

Por isso sinto incómodo em vir discutir, em 2008, a questão da liberdade. Mas a verdade é que os últimos tempos têm revelado factos e tendências já mais do que simplesmente preocupantes. As causas desta evolução estão, umas, na vida internacional, outras na Europa, mas a maior parte reside no nosso país. Foram tomadas medidas e decisões que limitam injustificadamente a liberdade dos indivíduos. A expressão de opiniões e de crenças está hoje mais limitada do que há dez anos. A vigilância do Estado sobre os cidadãos é colossal e reforça-se. A acumulação, nas mãos do Estado, de informações sobre as pessoas e a vida privada cresce e organiza-se. O registo e o exame dos telefonemas, da correspondência e da navegação na Internet são legais e ilimitados. Por causa do fisco, do controlo pessoal e das despesas com a saúde, condiciona-se a vida de toda a população e tornam-se obrigatórios padrões de comportamento individual.

O catálogo é enorme. De fora, chegam ameaças sem conta e que reduzem efectivamente as liberdades e os direitos dos indivíduos. A Al-Qaeda, por exemplo, acaba de condicionar a vida de parte do continente africano, de uma organização europeia, de milhares de desportistas e de centenas de milhares de adeptos. Por causa das regulações do tráfego aéreo, as viagens de avião transformaram-se em rituais de humilhação e desconforto atentatórios da dignidade humana. Da União Europeia chegam, todos os dias, centenas de páginas de novas regulações e directivas que, sob a capa das melhores intenções do mundo, interferem com a vida privada e limitam as liberdades.

Também da Europa nos veio esta extraordinária conspiração dos governos com o fim de evitar os referendos nacionais ao novo tratado da União. Mas nem é preciso ir lá fora. A vida portuguesa oferece exemplos todos os dias. A nova lei de controlo do tráfego telefónico permite escutar e guardar os dados técnicos (origem e destino) de todos os telefonemas durante pelo menos um ano. Os novos modelos de bilhete de identidade e de carta de condução, com acumulação de dados pessoais e registos históricos, são meios intrusivos. A videovigilância, sem limites de situações, de espaços e de tempo, é um claro abuso. A repressão e as represálias exercidas sobre funcionários são já publicamente conhecidas e geralmente temidas. A politização dos serviços de informação e a sua dependência directa da Presidência do Conselho de Ministros revela as intenções e os apetites do primeiro-ministro. A interdição de partidos com menos de 5000 militantes inscritos e a necessidade de os partidos enviarem ao Estado a lista nominal dos seus membros é um acto de prepotência. A pesada mão do Governo agiu na Caixa Geral de Depósitos e no Banco Comercial Português com intuitos evidentes de submeter essas empresas e de, através delas, condicionar os capitalistas, obrigando-os a gestos amistosos. A retirada dos nomes dos santos de centenas de escolas (e quem sabe se também, depois, de instituições, cidades e localidades) é um acto ridículo de fundamentalismo intolerante. As interferências do Governo nos serviços de rádio e televisão, públicos ou privados, assim como na “comunicação social” em geral, sucedem-se. A legislação sobre a segurança alimentar e a actuação da ASAE ultrapassaram todos os limites imagináveis da decência e do respeito pelas pessoas. A lei contra o tabaco está destituída de qualquer equilíbrio e reduz a liberdade.

Não sei se Sócrates é fascista. Não me parece, mas, sinceramente, não sei. De qualquer modo, o importante não está aí. O que ele não suporta é a independência dos outros, das pessoas, das organizações, das empresas ou das instituições. Não tolera ser contrariado, nem admite que se pense de modo diferente daquele que organizou com as suas poderosas agências de intoxicação a que chama de comunicação. No seu ideal de vida, todos seriam submetidos ao Regime Disciplinar da Função Pública, revisto e reforçado pelo seu Governo. O primeiro-ministro José Sócrates é a mais séria ameaça contra a liberdade, contra a autonomia das iniciativas privadas e contra a independência pessoal que Portugal conheceu nas últimas três décadas. Temos de reconhecer: tão inquietante quanto esta tendência insaciável para o despotismo e a concentração de poder é a falta de reacção dos cidadãos. A passividade de tanta gente. Será anestesia? Resignação? Acordo? Só se for medo...»

António Barreto, in Público, edição de 6.1.2008, pág. 37

Nem com uma Flor

Porventura por influência de alguns dos artistas que por lá têm passado, a nossa melhor casa de espectáculos, o CCVF, já se dá ares de prima-dona. A despeito do nome por que responde, já não se lhe pode bater nem com uma flor, que lhe estala o verniz. Quando contrariada, fica embezerrada, amua e até se põe verde. Há quem diga que até nem tem mau feitio e que o problema está na farpela com que a vestiram, bem-parecida e imponente, porém mui frágil, sensível e quebradiça.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Ouvido de Passagem

Requiem para quatro jovens -

Jovem nº 1- (…) e ele porque não veio?
J2- Disse que o avô dele foi para o hospital e que por isso não podia vir.
J3- E foi por isso que não veio?
J2- Sim, foi para o hospital…
J4- Então podíamos ir lá ao hospital…
J3- Quem tá fodido é o avô não é ele!
J4- Então vamos comer…
J1- Acho que sim!
J2- Hehehe…

Ouvido na Rua de São Gonçalo, dia 5 de Janeiro de 2008, 21h.

sábado, 5 de janeiro de 2008

Uma Teoria da Conspiração

As teorias valem o que valem e esta é só mais uma. Contudo, todas as teorias têm um fundamento. A minha teoria não é excepção.

Devo dizer, aos meus muitos e caros leitores, que estou profundamente convencido que há uma relação entre a Associação Comercial Vimaranense e algumas lojas de aparelhos auditivos. E passo a explicar o porquê desta minha insinuação:

Na véspera de Natal encontrava-me eu na Rua de Santo António a fazer as últimas compras. Todos os anos as faço, orgulhosamente fora de horas. Eram já 19h, a rua quase deserta, com suas lojas quase fechando. HoHoHo, HoHoHo. Subitamente passa por mim um bólide da Associação Comercial Vimaranense que, através de um péssimo sistema estereofonico debitava soundbites (já vi que pleonasmei) sobre o comércio tradicional. Assustado, eu – qual coelho de Páscoa prestes a pôr ovo – senti um zumbido a apoderar-se do meu tímpano esquerdo. Confuso, embati contra uma daquelas tochas de latão (permitam-me chamar-lhes assim) que se encontram espalhadas pela nossa bela (e não pedonal) Rua de Santo António. Após o embate a estearina quente, que contrastava com o frio que se fazia sentir, caiu sobre meus olhos azuis que, até aí, contrastavam com o vermelho das alcatifas que abraçavam os passeios. A dor foi insuportável. A confusão foi total. Cego e tonto, acabei por cair no tanque da Rua de Santo António. Como seria de esperar a hipotermia apoderou-se de mim e passei a consoada no hospital.

Para além dos problemas inerentes ao estado hipotérmico foi-me diagnosticada surdez. De imediato tive que me dirigir a uma loja para comprar um aparelho auditivo. E quando na loja, enquanto eu me tentava fazer entender, me escreveram num papelinho “sabemos porque está aqui”, eu vi logo que aqueles malandros tinham feito um acordo com a Associação Comercial Vimaranense. Exijo justiça!

Guimarães, antigo HSO – 28 do 12 de 2007